#114 Brilha, brilha, estrelinha!
Marianne Williamson via Nelson Mandela para uma pequena menina
Nosso grande medo não é o de que sejamos incapazes. Nosso maior medo é que sejamos poderosos além da medida. É nossa luz, não nossa escuridão, que mais nos amedronta. Nos perguntamos: "Quem sou eu para ser brilhante, atraente, talentoso e incrível?" Na verdade, quem é você para não ser tudo isso?
Marianne Williamson
🎧 I’m Every Woman
Para ouvir enquanto faz sua leitura
🗓️ O ano era 78
Originalmente interpretada por Chaka Khan em 1978, é uma música que celebra a força, poder e multiplicidade das mulheres. Escrita por Ashford & Simpson, a canção foi um grande sucesso e se tornou um hino de empoderamento feminino. Na voz de Chaka Khan, a música se destacou por sua energia e pelo simbolismo de união e diversidade que transmite, afirmando que as mulheres podem ser tudo o que quiserem, sem limitações impostas pela sociedade.
Whitney Houston gravou sua versão de "I'm Every Woman" em 1992. Ela incluiu a canção na trilha sonora do filme O Guarda-Costas (The Bodyguard), em que também estrelou. A versão de Whitney foi um grande sucesso, assim como a original de Chaka Khan, e trouxe um novo fôlego para esse hino de empoderamento1.
Contexto
Quando Chaka Khan lançou a música, era um período de grande transformação para o movimento feminista, com mulheres lutando por igualdade de direitos e reconhecimento de suas capacidades. A canção reflete essa luta, ao afirmar que a mulher é versátil, poderosa e pode desempenhar diversos papéis ao mesmo tempo, seja no trabalho, na família ou na vida pessoal.
1978!!! Eu ia completar 6 anos e perdi essa mensagem na época.
"I'm every woman, it's all in me" significa que cada mulher tem dentro de si a força, a sabedoria e a capacidade de fazer o que precisar. A música é um tributo à ideia de que as mulheres têm múltiplas facetas e, ao abraçar isso, podem brilhar em todas as áreas de suas vidas.
Invisibilidade
A gente cresce sem se ver, sabe?
Assisti às histórias dos outros, como se o meu lugar fosse sempre ali, nos bastidores.
Meninas negras dos anos 70/80 como eu, como tantas, aprenderam cedo que os holofotes não foram feitos para elas. A falta de representatividade na mídia foi muito além da tela; afetou a autoestima e a forma como construímos quem somos.
Quando a gente não se vê, começa a se perguntar: será que eu pertenço a esse lugar? Sou suficiente?
Representatividade importa, sim, e muito! É através dela que nos enxergamos com mais nitidez, percebemos o nosso valor, nosso potencial. Quando nos vemos no centro, entendemos que também podemos ocupar esse lugar, que não precisamos aceitar apenas papéis secundários. Somos dignas de estar em destaque.
Lembro da Revista Raça como um marco. Ali, pela primeira vez, eu me vi representada com orgulho. Era um espaço de celebração, onde a nossa beleza, nossa cultura e nossa história eram reverenciadas. Comecei a entender que não era exagero me ver como protagonista, que o espaço também era meu.
Hoje, o recado é simples: é hora de nos apropriarmos de quem somos. Sem medo, sem hesitação. Chegou o momento de olharmos e sabermos que merecemos, que o protagonismo também é nosso. Na teoria, eu sei exatamente o meu valor. Mas, no dia a dia, ainda tropeço nas velhas percepções e paradigmas, aqueles que cresceram comigo e me lembram do contexto em que vivi. É um processo. Um passo de cada vez, entre reconhecer quem eu sou e me libertar do que aprendi lá atrás. Mas, uma coisa é certa: sigo caminhando.
Exibida!
Era uma vez uma menina que gostava de dançar, mas não qualquer dança. Seus movimentos falavam, como palavras sem voz. Cada passo narrava uma história que o corpo não podia guardar. Diziam que ela brilhava – todos viam, menos ela. Pelas costas, sussurravam:
Exibida!
Com o tempo, ela aprendeu a andar de cabeça baixa. Não era o chão que lhe interessava, mas o desejo de evitar seu próprio reflexo. Espelhos, com suas superfícies frias e impiedosas, eram seus maiores inimigos. Ali, ela fugia das partes de si que, um dia, acreditou serem grandes demais para caber no pequeno mundo ao redor.
Sempre foi assim. Fazia coisas incríveis – ou pelo menos era o que diziam. Fazia rir, fazia pensar, fazia sentir. “Ah, mas isso é normal,” ela respondia, como se o talento que carregava fosse só mais um detalhe esquecido no calendário. Mas, no fundo, uma voz teimosa, que ela aprendera a calar, sussurrava:
Será que você não vê? Será que é tão difícil assim acreditar que você é tanto quanto os outros dizem?
Ela não via. Ou talvez não quisesse ver. Ser brilhante, como ousavam chamar, parecia uma responsabilidade esmagadora, quase um fardo. Quem era ela para reivindicar algo tão grandioso?
Exibida!
Ecoava nos recantos mais sombrios da sua mente. E, assim, começou a varrer os elogios para debaixo do tapete, sem perceber que, um dia, o chão cederia sob o peso.
Um dia, algo mudou. Não foi um clarão, nem uma revelação. Foi uma faísca – pequena, quase despercebida. Talvez tenha sido o jeito como alguém a olhou, com um olhar que parecia dizer:
Você sabe que pode parar de fugir, não sabe?
E, naquele instante fugaz, uma rachadura se abriu. A menina, agora mulher, começou a desconfiar que, talvez, houvesse algo mais. Talvez o que os outros viam não fosse um exagero, mas sim uma verdade que ela se recusava a abraçar por medo de ser, outra vez, chamada de exibida.
E se ela decidisse se apropriar de si mesma? Não como um fardo, mas como um ato de coragem? Quem decidiu que ser grandiosa era errado? Talvez, escondido no eco de “exibida”, estivesse o convite para aceitar sua própria luz, mesmo quando o mundo insistia em apagá-la.
Ela sorriu sozinha, irônica e quase sarcástica:
Exibida... E daí?
Era chegada a hora de tomar posse do brilho que, de tão natural, ela quase esquecera que era seu.
Bancar o pequeno não ajuda o mundo. Não há nada de brilhante em encolher-se para que as outras pessoas não se sintam inseguras em torno de você. E à medida que deixamos nossa própria luz brilhar, inconscientemente damos às outras pessoas permissão para fazer o mesmo.
Marianne Williamson
Alguns textos são terapêuticos, curando lentamente.
Outros são catarses.
Nosso Maior Medo
Discurso de Nelson Mandela
Os dois textos de Marianne Williamson, citados aqui, fazem parte do discurso de Nelson Mandela durante sua posse como presidente da África do Sul em 1994.
O trecho de Our Deepest Fear (Nosso Maior Medo) amplamente atribuído a Mandela é, na verdade, uma citação de Williamson em seu livro A Return to Love (1992). Reflete sobre o medo que temos de nossa própria grandeza e luz, afirmando que não devemos temer brilhar, pois ao fazê-lo, inspiramos outras pessoas a fazer o mesmo.
Contexto do momento histórico: a superação do apartheid2 e a construção de uma nova nação baseada em igualdade e esperança, valores que Mandela encarnou ao longo de sua vida.
Não curto essa palavra, eu costumo usar com ressalvas.
O apartheid foi um sistema de segregação racial institucionalizada que vigorou na África do Sul de 1948 a 1994. Implementado pelo governo de minoria branca, esse regime legalizou a discriminação racial em todas as esferas da vida, segregando a população negra e outras etnias em áreas residenciais, escolas, transporte e até mesmo locais públicos. Os direitos políticos e econômicos da maioria negra foram severamente restringidos, e a resistência ao regime foi brutalmente reprimida. O apartheid terminou oficialmente em 1994 com a eleição de Nelson Mandela como o primeiro presidente negro do país, marcando o início de uma nova era de democracia e reconciliação na África do Sul.
Salvei para ler mais vezes essa edição. Amei!!
Me lembrou um poema de Pessoa.
"Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive."
Um beijo, Andrea.
Que texto importante e necessário, tá tudo aqui e mais um pouco, amei 🥰🥰🥰